Tatiana Takeda é referência em todo o Brasil em razão de sua atuação junto às famílias de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
É advogada, professora universitária, mestre em Direito e especialista em Ensino Estruturado para Autistas. Através das Redes Sociais passou a disseminar informação de qualidade a respeito dos Direitos e Inclusão das Pessoas com Deficiência.
Em uma breve conversa, Tatiana respondeu a uma das perguntas que mais preocupa as famílias das crianças com diagnóstico de Apraxia de Fala na Infância: os direitos a elas garantidos – de inclusão escolar, inclusive – mesmo sem a existência de laudo.
Falou também a respeito de retenção escolar
- Estamos em um momento no qual se tem falado bastante a respeito de Direitos das pessoas com deficiência: inclusão, direito à saúde, direitos sociais. Quais os principais avanços que podemos considerar na legislação nos últimos anos? A que você atribui toda a movimentação?
O marco no ordenamento jurídico mundial é a Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, realizado em Nova Iorque, em 2006. O Brasil foi signatário e recepcionou a declaração como emenda constitucional. A partir daí, foi criada a Lei Brasileira de Inclusão (2015), que é a Lei nº 13.146/2015. Com todo o respeito pela nossa Constituição Federal, considero a LBI o nosso maior instrumento de defesa dos direitos.
- Mesmo com a existência da Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015), que garante o amplo acesso de alunos com necessidades especiais, nas escolas regulares ainda nos deparamos com situações de negativa de matrícula ou mesmo uma recusa velada por parte de algumas instituições. Quais as garantias existentes na legislação e o que as famílias que se deparam com uma situação assim devem fazer?
As ferramentas jurídicas estão ao alcance de todos. Normas como a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência) , Estatuto da Criança e do Adolescente (Estatuto da Criança e do Adolescente), Lei de Diretrizes e Bases (Lei de Diretrizes e Bases ) e a Constituição Federal de 1988, são a base principal. De mãos disso, o interessado deve diligenciar no sentido de dirigir-se, conforme o caso, aos Conselhos, Delegacias (especializadas, de preferência) e órgãos de defesa como Ministério Público e Defensoria Pública.
- A Lei garante o direito de acompanhante para a criança com necessidades especiais, mas especificamente para aquelas crianças com diagnóstico de Apraxia de Fala na Infância ou mesmo para uma criança sem diagnóstico fechado, sem CID portanto, como a família pode conseguir o acompanhante (mediador)?
Os gestores públicos e privados tendem a ofertar esse apoio mediante laudos médicos fechados. Esta rigidez prejudica os pacientes/alunos que não possuem diagnóstico. Entendo que diante disso temos uma ótima briga jurídica, pois a partir do momento em que, de mãos do relatório médico contendo as informações necessárias (embora sem CID), conseguimos “encaixar” essas características no conceito de pessoa com deficiência (art. 2º da LBI2), fica mais do que justificada a intervenção no processo de aprendizagem do aluno. Lembrando ainda que toda criança/adolescente dos 4 aos 17 anos tem direito à Educação e educar não é apenas “depositar” o aluno na sala de aula.
- Com relação aos demais Direitos garantidos às pessoas com deficiência, o laudo é condição?
A ideia ainda continua sendo baseada no conceito. No entanto, temos uma rigidez junto aos órgãos públicos, em especial. Também está-se diante de uma construção jurídica e uma ótima briga judicial.
- A Lei nº 12.764/2012 (Política Nacional de Defesa dos Direitos das Pessoas com Transtorno do Espectro Autista) estendeu aos autistas todos os direitos previstos nos diplomas normativos a respeito das pessoas com deficiência. Na prática, de que forma tal reconhecimento auxilia as pessoas com diagnóstico de TEA?
A referida lei veio colocar uma “pá de cal” em uma discussão que juridicamente era pacífica. Com o CID 10 F84.0, a pessoa era sim considerada carecedora de políticas públicas. Ao estancar as discussões na área social, ficou mais claro para a sociedade que o autista é pessoa com deficiência por se encaixar no próprio conceito de pessoa com deficiência, nos moldes da Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006), e, bem assim, sujeito de direitos.
- A regulamentação da educação domiciliar no Brasil – Home Schooling – ainda não aconteceu. Você acredita que o projeto vá abarcar as crianças com necessidades especiais, que muitas vezes não conseguem se moldar à educação tradicional, ou regulamentará somente os casos de crianças típicas?
Embora, neste momento, o Projeto de Lei nº 2401/2019 (Acesse Aqui) – de inciativa do Executivo – esteja tramitando de forma menos ágil como se esperava – Câmara Federal -, prevejo que muito provavelmente vão estender a educação domiciliar para os alunos de inclusão, observados os requisitos que serão criados.
- Os pais de crianças com algum tipo de necessidade especial frequentemente enfrentam a decisão de reter ou não o filho na pré-escola ou algumas vezes além.
Embora essa decisão nunca seja fácil e muitas questões diferentes precisem ser consideradas, em última análise, cabe aos pais com base nas considerações da equipe multidisciplinar e da escola da criança decidir pela retenção ou não de seu filho. A legislação brasileira ampara os pais que queiram tomar essa decisão?
De forma direta, desconheço quaisquer normas federais que versem sobre o assunto. Existe uma Recomendação do MEC, de 2011, que dispõe sobre a retenção ou não do 1º ao 3º ano do fundamental. Com relação a este assunto, acredito, piamente, que esta decisão deve ser tomada pela tríade: escola, família e equipe multidisciplinar terapêutica.
- As mídias eletrônicas acabam sendo uma ferramenta de informação. “Direito e Inclusão”, da qual você é administradora, é considerada uma fonte segura de informação. Como surgiu e como você vê o seu papel frente a comunidade?
Já utilizava o Facebook (Direitos e Inclusão das Pessoas com Deficiência – Prof. Tatiana Takeda) há algum tempo. No entanto, percebi a importância de se alcançar as pessoas e levar informações que, além de agregar juridicamente, também levassem esperança e alertas. Com isso, criei a marca Direito e Inclusão (devidamente registrada) e passei a me dirigir ao público também pelo instagram (@direitoeinclusao), youtube (Professora Tatiana Takeda) e site (www.tatianatakeda.com.br). Com essas mídias, minha pretensão é alcançar aqueles que padecem de informações seguras e colaborar para a disseminação da máxima de que “a inclusão é um caminho sem volta”, que se tornou o meu slogan de atuação.
Não é fácil conviver com os olhares, palavras e ações das pessoas que julgam nossos filhos pela aparência e/ou comportamento. Parece que essa substancial parcela da sociedade se esquece que qualquer pessoa pode ter uma familiar com deficiência ou se tornar uma pessoa nesta condição. Falta muita empatia e a discriminação é comum nos quatro cantos do nosso Brasil. No entanto, nosso papel é não sucumbir aos atos que constrangem aqueles que são diferentes (o que é normal?) e denunciar. Vá a uma delegacia, Conselho, MP, Defensoria Pública, mídia… mas não aceite.
Infelizmente, a História nos revela que nem sempre o homem aprende pelo amor… então, que seja pela dor, no bolso, porque discriminar pode gerar sim danos morais (civil), além de reclusão e multa (criminal).
Não se esqueçam: A inclusão é um caminho sem volta.