Mas afinal, o que faz a terapia fonoaudiológica “diferente” para as crianças com Apraxia de Fala na Infância
Sabemos que Apraxia de Fala na Infância é um distúrbio motor neurológico, que se manifesta pela dificuldade ou pela incapacidade de planejar e programar a sequência rápida de movimentos envolvidos na produção da fala. Os articuladores como lábios, língua, palato mole (“céu da boca”), mandíbula, pregas vocais – e os músculos que movem estas estruturas – precisam ser ativados para se movimentarem na hora certa, na ordem certa, com a força adequada, para que as palavras sejam produzidas com precisão e clareza.
Por isso, considerando que a dificuldade principal é a dificuldade está no planejamento e programação dos MOVIMENTOS da fala, a abordagem fonoaudiológica deve ser direcionada para o real movimento destas estruturas e músculos da fala. Nossa atuação como terapeutas, é ajudar a criança a aprender como realizar esses movimentos, para produzir palavras, frases para se comunicar.
Se então, a Apraxia de fala na Infância afeta o aprendizado motor da fala, uma pergunta interessante é: “como ocorre o aprendizado motor?”. Como as pessoas aprendem, por exemplo, a acertar uma bola de basquete na cesta? Como as pessoas aprendem a andar de bicicleta? Como estas habilidades motoras se tornam automáticas, de modo que não é preciso pensar muito bem em fazê-las?
Inúmeras pesquisas vêm buscando evidências sobre como a aprendizagem motora ocorre nas pessoas. Os princípios e teorias desta pesquisa também foram aplicados à aprendizagem motora da fala, e formam a base destas ideias, estão sendo incorporadas na terapia fonoaudiológica adequada para crianças com Apraxia. Mais pesquisas são necessárias, mas especialistas usaram os “Princípios da Aprendizagem Motora” como um entendimento comum de como tratar a Apraxia da Fala na Infância. Assim, há uma série de características da terapia da fala que parece ser mais bem-sucedida para crianças com Apraxia de Fala, independentemente do nome de um método específico.
Esses recursos incluem:
1) Prática e repetição com fala.
A terapia é mais efetiva quando os alvos da fala (palavras, frases) são praticados com maior grau de frequência e intensidade.
Os pais e cuidadores serão convidados a ajudar a criança a praticar na vida real, fora da terapia da fala. Intensidade (praticando muito) e frequência (praticando frequentemente) são conceitos fundamentais na aprendizagem motora da fala. É por essa razão, especialmente nas fases iniciais da terapia, que as crianças com apraxia devem ter terapia fonoaudiológica individual.
De acordo com a pesquisa atual, gastar valioso tempo de terapia em movimentos não-verbais (por exemplo, soprando bolhas, tentando tirar algum creme ou chocolate de trás dos dentes, ou ainda, exercícios de língua, etc.) não são formar de alcançar mais eficácia na produção da fala.
2) Uso de Pistas Multissensoriais
A terapia apropriada para crianças com apraxia deve incluir informações sensoriais aumentadas para ajudar no controle das sequências do movimento da fala. Assim, dicas ou pistas visuais, verbais, táteis/proprioceptivas são usadas na terapia fonoaudiológica. As dicas da Terapeuta são diferentes tipos de “lembretes” sobre o que seu filho deve fazer ao tentar falar uma palavra ou frase.
Por exemplo, um fonoaudiólogo aponta para sua garganta quando o primeiro som da palavra que a criança vai tentar é um som feito na parte de trás da garganta (k, por exemplo). A criança pode observar um movimento feito pela Terapeuta e isso desencadeia a lembrança da posição da língua na parte de trás da garganta. A criança está recebendo uma “sugestão visual” sobre por onde começar a produzir o alvo da fala. Vendo o terapeuta apontar para sua garganta ajuda a lembrar a criança de como começar com o movimento para a palavra em particular.
Um outro exemplo: o fonoaudiólogo pode usar suavemente os dedos para pressionar os lábios da criança juntos quando ele precisar fazer um som “bilabial” como parte da palavra-alvo (os sons dos lábios são chamados de sons bilabiais e incluem /m/, /b/, e /p/). Sentindo o toque e os lábios juntos, ajuda a criança a saber como iniciar um som labial. Este é um exemplo de um “toque” ou uma pista tátil. Há muitos exemplos de pistas e eles aproveitam a visão, o tato ou a compreensão para ajudar a criança a obter o movimento de fala necessário.
Da mesma forma que as pistas devem ser utilizadas para ajudar, o Terapeuta também deve ter em mente, que a retirada delas, é igualmente importante, para que a criança siga de forma independente. Nós, Fonoaudiólogos, iremos trabalhar, para que a criança com o tempo e treino, não dependa mais destas pistas e assim, sua fala possa ser automatizada.
3) Feedback
A Fonoaudióloga também deverá dizer ou alertar a criança, se as tentativas de fala dela foram corretas ou incorretas. A Fonoaudióloga, também tomará o cuidado para determinar a quantidade de ajuda que ela dará à criança (importante não sobrecarregá-la com várias informações ao mesmo tempo!). Por exemplo, a Fonoaudióloga, poderá dizer “fique com os lábios ou boca fechada” ou “explode sua boca”. Esse tipo de informação, é chamada de “conhecimento de performance”, ou seja, damos um feedback específico, explicamos exatamente o que a criança precisa fazer. Existe um outro tipo de feedback, também conhecido como “atrasado” ou de “conhecimento de resultado”. Neste caso, a Fonoaudióloga, dirá apenas foi “ok” ou “muito bem&rdq uo; ou “quase”, depois que a criança já tiver tentado produzir os alvos selecionados para a terapia. São informações mais gerais que ajudarão a criança perceber se ela foi bem-sucedida.
Os Fonoaudiólogos experientes saberão pensar cuidadosamente sobre:
Quanto feedback dar à criança?
Que tipo de feedback?
Em que momento deve ser dado?
4) Ritmo
O uso de ritmo pode ajudar a estimular a fala e contribuir com a naturalidade dos padrões de entonação e acentuação (tanto no nível da sílaba como da palavra). Sabemos que as crianças com Apraxia apresentam dificuldade com o ritmo da fala (alteração prosódica está presente e inclusive é uma marca importante para o diagnóstico diferencial). Exemplos de uso de ritmo na terapia fonoaudiológica é a criança poder ser bater palmas para cada sílaba da palavra ou bater palmas, mais forte quando se diz a sílaba que deve ser enfatizada em uma palavra.
5) Foco nas sequências de fala
Embora algumas crianças com Apraxia de Fala possam precisar de ajudar para os fonemas (sons), é importante enfatizar que o principal “trabalho” e prática que as crianças precisam é conseguir passar de som para som, sílaba para sílaba e/ou palavra para palavra.
Lembre-se de que a fala é uma série de movimentos rápidos e altamente refinados, e as crianças com Apraxia têm dificuldades no planejamento e programação destes movimentos. Isso significa que apenas “instalar fonemas ou trabalhar individualmente fonemas” não será efetivo para elas. Fonoaudiólogas experientes irão incorporar o fonema (som) que está sendo ensinado em palavras curtas e funcionais.
Além disso, é consenso entre os Profissionais com experiência em Apraxia de Fala na Infância, que os alvos de fala (palavras, frases) devem ser funcionais para a criança. Isso significa que as palavras devem ser úteis, práticas e algo que a criança possa realmente querer dizer e usar no dia-a-dia! Por exemplo, as palavras “oi” e “tchau” são muito úteis (por exemplo, funcionais). Palavras monossílabas são mais simples do que palavras com mais sílabas.
A Fonoaudióloga deve analisar com cuidado sobre quais alvos praticar com seu filho ou filha. Ela também considerará quais tipos de formas silábicas utilizar (analisar quais consoantes e vogais, a criança já pode produzir). Certamente palavras formadas com a estrutura Consoante-Vogal (CV) será mais recomendada do que a estrutura Consoante-Vogal-Consoante (CVC). Palavras que a criança queira tentar dizer ou aquelas que ela use mais frequentemente deverão ser selecionadas primeiro.
Fonoaudiólogos experientes não irão esperar que os sons sejam produzidos com “perfeição” antes de passarem para novos sons ou palavras. Fonoaudiologia é como uma forma de arte.
O terapeuta ajudará cuidadosamente seu filho a construir sílabas, palavras e frases maiores e mais complexas, praticá-las implacavelmente; orientar e moldá-los em palavras e frases precisas cada vez mais próximas; e “voltar” para ensinar novos sons ou aprimorar os sons existentes no processo.
6) Necessidade de sucesso
Muitas crianças com Apraxia de Fala sentem-se derrotadas pela dificuldade que sentem em tentar falar ou conversar. Muitas crianças já experimentaram terapias que não a ajudaram a falar e com isso, a sensação de fracasso fica ainda maior. Terapeutas e pais referem que elas sabem o quanto é difícil falar. Elas experimentam a sensação de “que a boca não funciona”.
É importante que os Fonoaudiólogos que estão trabalhando com seu filho tenham um foco imediato em como podem ajudá-lo a ter sucesso rápido na terapia. Uma criança com Apraxia pode ter desistido de tentar falar, antecipando a dificuldade e a falha que tiveram em tentativas anteriores ou em terapia prévia. Ao planejar cuidadosamente os objetivos da prática de fala e estruturar a terapia para o sucesso, as crianças com Apraxia podem confiar no Fonoaudiólogo, no processo de terapia, crescer confiantes e começar o importante e árduo trabalho que terão à frente.
É importante também em casa, a criança também experimentar sucesso com tentativas de fala em casa. Os pais muitas vezes estão ansiosos para fazer alguma coisa! Eles frequentemente perguntam: “O que podemos fazer em casa?” Os pais e outros cuidadores são definitivamente uma parte importante da jornada para a fala de seus filhos! Especialmente para crianças com Apraxia, o envolvimento dos pais é crucial.
Dito isto, um Fonoaudiólogo experiente e bem-sucedido com crianças que tenham Apraxia de Fala na Infância, servirá como guia e orientador sobre a melhor forma de ajudar em casa. Eles querem ter certeza, da melhor forma possível, de ajudar seus filhos. Sucesso gera sucesso.
Quanto mais confiança seu filho ganhar ao assumir riscos ao fazer tentativas de fala, mais ele se beneficiará da terapia da fala.
Referência Consultada: What Makes Speech Therapy Different for Children with Apraxia? From: CASANA. Apraxia Kids. www.apraxia-kids.org.
Texto traduzido e adaptado por: Dra. Elisabete Giusti. Fonoaudióloga Clínica.
**ESCLARECIMENTO SOBRE TRADUÇÃO***
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